Síndrome de Asperger
Por ronaldo em 18 de outubro de 2017
Contexto histórico
Em 1944, o psiquiatra austríaco Hans Asperger publicou um trabalho intitulado “psicopatia autista”, em que descrevia um grupo de adolescentes que apresentava comportamento social ingênuo e peculiar. Faltava a esses indivíduos o conhecimento intuitivo de como adaptar suas respostas às necessidades e personalidades dos outros (ASPERGER, 1944 apud WING, 1981).
Por entender que “psicopatia autista” poderia ser erroneamente associada a comportamentos sociopatas, Lorna Wing, psiquiatra inglesa, propôs o termo Síndrome de Asperger para caracterizar os adolescentes descritos por Hans Asperger (WING, 1981). Assim, cinquenta anos após a sua descrição, o termo Síndrome de Asperger (SA) foi incluído, pela primeira vez, no DSM-IV3 e CID-X4, para descrever um tipo de transtorno mental. Atualmente a SA aparece, juntamente com o Autismo, o Transtorno de Rett, o Transtorno Desintegrador da Infância e o Transtorno Global do Desenvolvimento sem outra especificação (TGD-SOE), como subcategoria do Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD).
Algumas das características peculiares mais frequentemente apresentadas pelos portadores da Síndrome de Asperger são:
– Atraso na fala, mas com desenvolvimento fluente da linguagem verbal antes do 5 anos e, geralmente, com:
- Dificuldades na linguagem;
- Linguagem pedante e rebuscada;
- Ecolalia ou repetição de palavras e/ou frases ouvidas de outros;
- Voz pouco emotiva e sem entonação.
– Interesses restritos: escolhem um assunto de interesse, que pode ser seu único foco de atenção por muito tempo. Costumam apegar-se mais às questões factuais do que ao significado. Casos comuns são o interesse exacerbado por coleções (dinossauros, carros, etc.) e cálculos. A atenção ao assunto escolhido existe em detrimento de assuntos sociais ou cotidianos.
– Presença de habilidades incomuns como cálculos de calendário, memorização de grandes sequências como mapas de cidades, cálculos matemáticos complexos, ouvido musical absoluto etc.
– Interpretação literal: incapacidade para interpretar mentiras, metáforas, ironias, frases com duplo sentido etc.
– Dificuldades no uso do olhar, das expressões faciais, dos gestos e dos movimentos corporais como comunicação não verbal.
– Pensamento concreto.
– Dificuldade para entender e expressar emoções.
– Falta de autocensura: costumam falar tudo o que pensam.
– Apego a rotinas e rituais, com dificuldade de adaptação a mudanças e fixação em assuntos específicos;
– Atraso no desenvolvimento motor e frequentes dificuldades na coordenação motora tanto grossa como fina, inclusive na escrita;
– Hipersensibilidade sensorial: sensibilidade exacerbada a determinados ruídos, fascinação por objetos luminosos e com música, atração por determinadas texturas etc.;
– Comportamentos estranhos de auto estimulação;
– Dificuldades em generalizar o aprendizado;
– Dificuldades na organização e planejamento da execução de tarefas;
Algumas coisas são aprendidas na idade “própria”, outras cedo demais, enquanto ou outras só serão entendidas muito mais tarde ou somente quando ensinadas.
Algumas orientações para professores, educadores e cuidadores
É importante que o professor verifique com alguma frequência que o aluno esteja acompanhando o assunto da aula.
Além disto, é aconselhável, também, que este aluno:
- Sente o mais próximo possível, que este aluno;
- Seja requisitado como ajudante do professor algumas vezes;
- Use agendas e calendários, listas de tarefas e listas de verificação;
- Seja ajudado para poder trabalhar e concentrar-se por períodos cada vez mais longos;
- Seja estimulado a trabalhar em grupo e a aprender a esperar a vez;
- Aprender a pedir ajuda;
- Tenha apoio durante o recreio onde, por exemplo poderá dedicar – se a seus assuntos de interesse, pois caso contrário poderá vagar, dedicar-se algum assunto inusitado ou ser alvo de brincadeiras dos colegas;
- Seja elogiado sempre que for bem sucedido.
Como reconhecer e ajudar seu aluno com SA
Um profissional – terapeuta ou professor – que faça o papel de “mentor” ou facilitador pedagógico é fundamental para mediar relações sociais do aluno com SA, assim como viabilizar sua aprendizagem. Abaixo estão descritas estratégias de intervenção, considerando as características da SA.
– Início de semestre – O contexto não familiar, as disciplinas novas, colegas e professores desconhecidos causam, de um modo geral, extrema ansiedade. É relevante que o professor inclua na ementa/programa das disciplinas um quadro especificando o local dos encontros, cronograma de aulas, os trabalhos a serem realizados, assim como o que espera que cada aluno aprenda (competências). Considerando que o aluno com SA, muitas vezes, apresenta dificuldades em mudar de rotinas, é recomendado que o docente avise, o mais prontamente possível, sobre mudanças no programa.
– Trabalhos escritos – Problemas de coordenação motora fina e organização de ideias poderão causar sérias dificuldades ao aluno com SA na realização de trabalhos e provas escritas. Softwares de predição de palavras e ferramentas de organização da escrita, como mapas conceituais, podem ser fundamentais para a produção de textos.
– Isolamento social e participações em grupos – Ao perceber a dificuldade do aluno com SA de interagir socialmente, é recomendável que o docente defina, previamente, os grupos de trabalho ao invés de aguardar que os alunos se agrupem. São, em geral, recomendados grupos pequenos, não excedendo cinco membros.
– Testes e avaliações – O hiperfoco em determinadas áreas acadêmicas podem fazer com que o aluno deixe outras disciplinas em segundo plano. O professor poderá solicitar trabalhos em que o tema de interesse do aluno esteja vinculado ao conteúdo trabalhado, de modo a complementar a avaliação.
– Atraso na entrega de trabalhos – a ansiedade e dificuldades nas funções executivas (planejar, priorizar, selecionar) podem prejudicar a realização de tarefas e cumprimento de prazos. Por esse motivo, alguns jovens conseguem ingressar no ensino superior, mas abandonam a universidade em seguida (WING, 1981). O professor que atua como mentor ou facilitador deverá orientar o aluno a manter uma agenda onde constem datas de entrega de trabalhos e observações importantes como “não entendi o que o professor pediu, preciso perguntar novamente”.
– Aulas expositivas – É sempre importante salientar que muitos desses alunos são pensadores visuais que melhor processam informações gráficas do que auditivas. Assim, o uso de recursos visuais, como a escrita no quadro, Datashow, fichamento de aulas e mapas conceituais, podem ser essenciais no processo de aprendizagem.
– Apresentação de trabalhos – sob ansiedade e tensão o aluno pode transpirar mais do que o normal e fazer movimentos corporais estranhos (balançar o corpo de um lado para outro ou contorcer as mãos). O professor ou um colega poderão apoiar o aluno, fornecendo instruções claras de conduta. Assim, podem dizer “está tudo bem, leia o texto (ou a tela)”. Após a apresentação, é relevante ressaltar os pontos positivos do trabalho, como “gostei quando você falou…”.
– Vocabulário “pedante” ou incomum – o uso de palavras incomuns distancia o aluno dos demais. Conversar com o aluno com SA, elogiar seu vocabulário e sugerir o uso do dicionário para escolher sinônimos adotados em sua região/grupo social pode ajudar.
– Dificuldade em iniciar e manter uma conversação – a conversação flui melhor se o assunto girar em torno dos temas de seu interesse. De um modo geral, o aluno com SA tenta iniciar uma conversa com uma pergunta cuja resposta já conhece. Ao receber essa resposta, encerra abruptamente a conversa por, muitas vezes, não saber o que dizer em seguida. O professor ou colega podem, então, fazer uma pergunta mais diretiva (você fez o trabalho de mecânica?) para manter a interação.
– Compreensão literal – considerando o pensamento concreto e as dificuldades em compreender a linguagem não literal, o professor deverá ser cuidadoso ao usar figuras de linguagem. Assim, ao invés de dizer “o trabalho poderá ser entregue em um século”, ressaltando o extenso tempo para a sua realização, é aconselhável que determine o prazo, especificando o dia de entrega das tarefas.
– Situações de conflitos – a dificuldade em colocar-se no lugar do outro pode levar o aluno com SA a não entender pontos de vista alheios, que, junto à rigidez de pensamento, resulta em comportamento inflexível e incapac樂威壯
idade de negociar soluções de conflitos. O professor e colegas podem promover meios do aluno expor suas ideias, sem entrar em “luta de força”.
– Situações embaraçosas – apesar do fato de pessoas com Asperger terem compreensão intelectual de constrangimentos e gafes, são incapazes de aplicar estes conceitos no nível emocional.
– Sensibilidade sensorial – Sons (barulho do ar condicionado e das pessoas falando em voz alta) podem causar ansiedade e irritação. O piscar da luz fluorescente pode ser imperceptível para a maioria das pessoas, mas muito perturbadora para as pessoas com SA. Ao perceber o incômodo do aluno (inquietação, tampar os ouvidos, expressão facial tensa), o professor pode pedir silêncio à turma, diminuir a incidência de luz ou, ainda, perguntar se o aluno gostaria de sair da sala por alguns minutos.